sábado, 11 de junho de 2011

Solidão a dois

Foi num sábado à noite, quando se pegou do lado dele numa mesa de pizzaria de frente à novela das oito, que ela sentiu o começo do fim. Sentados em cadeiras altas de madeira fedorenta, com uma travessa gigante de frango à parmegiana e nenhuma palavra na boca. Dia doze de junho de dois mil e dez. Ela tentou! Eles tentaram! Não era isso que deviam fazer? Dia dos namorados: casais saem p'ra comer frangos à parmegiana pelas pizzarias da cidade. Só faltava o casal. Com a ausência de qualquer contato, ela percebia que tinha do lado um estranho. Estranho que às vezes ficava nu em cima dela tentando não se fazer mais estranho. Continuava sendo! Ela, assim como uma epifania, percebeu que a única parte de dentro que ele conhecia era a do seu sexo. A voz de Maitê Proença vinda do telão de cinema na parede se misturava à conversa da mesa ao lado. Um casal, que assim como outros casais, saíram pra comer frangos à parmegiana naquela noite. A conversa era insuportavelmente ininterrupta. Entre um assunto e outro soltavam um prometequevaificarcomigoprasempre, nãoqueronuncateperder, vocêeratudooqueeuprocurava. Não largavam a mão. E, engraçado, sentavam um à frente do outro; e não passavam nem o olho em Maitê Proença no telão. Ela se perguntava se um dia havia tido palavras, se um dia havia prometido alguma coisa, se um dia houvera tido medo de perdê-lo. Ou se sempre foram dois estranhos em frente à novela das oito que trepavam nos fins de semana talvez na tentativa de suprir uma carência crônica. A culpa foi da ausência de figura masculina em minha vida, sempre soube, pensava. A culpa foi desse insuportável complexo de inferioridade dele. Ela então buscava coragem p’ra correr dali, sem culpa, p’ra qualquer outro lugar que se sentisse mais em si. Numa agonia que não cabia mais nela, ela quebra o silêncio. Eu tinha tanta coisa pra dizer, até que te encontrei. ... ... Talvez se tivessem ido ao sushi que ela havia sugerido. Talvez se não fosse uma luz tão azulada, talvez se não fosse Maitê Proença no telão da parede, talvez se não fosse o casal ao lado. Mas era! Eles não estavam preparados. Intimista de menos. Levantou da mesa antes de qualquer reação. Saiu caminhando no frio junino da cidade de São Paulo e se convencendo, cada vez mais, de que o fim pode anular tudo de lindo que um dia talvez tenha existido (existiu?). O fim chegara do nada. Num sábado à noite, numa pizzaria do centro da cidade. Não a deixara nem terminar o frango. Percebeu que os fins, assim como começos, são difíceis de serem racionalizados. Eles chegam e ponto. Ou melhor, ponto e vírgula. É, A estrada continua.

5 comentários:

  1. amei. amo tudo o que tu escreve. te amo.

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  2. que dúvida triste essa de não saber se existiu algo.

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  3. Fui procurar ao lado quem era o(a) responsável por publicar nos dias 11. E depois de ter ficado encantada com o texto, com a história, vi que era de Bárbara Lima e isso fez com que fosse ainda mais encantador. Esses dilemas da vida são tão misteriosos, que mesmo quando doem, encantam um pouco depois da dor curada. Finais que não mandam aviso prévio.. acho que na maioria dos relacionamentos, não há uma última página pressentida. Há apenas algo que desbota, evapora, e aos poucos se vai. Assim mesmo, entre frangos à parmegiana, sexo na tentativa de estranharem-se menos, e jantares a dois para serem ainda um casal.

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  4. Eu fico com medo de comentar alguma coisa sobre um texto de Bárbara Lima, e com ainda mais medo depois do comentário de Larissa Lins.

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  5. é mesmo um texto de quem lê caio fernando

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