quarta-feira, 7 de setembro de 2011

32 dentes

Um infindável copo de cachaça e um suado sovaco exposto. 32 dentes era a idade que tinha quando, enfim, resumiu-se a essas qualidades.

Que sabia do mundo, ou melhor, que mundo saberia dele enquanto só o conhecia através do vidro do copo? Que mal fazia por criar sua própria água benta? Pobre diabo, ardia a cada gole mesmo em sua (improvisada) água sagrada.

Em seu aniversário de trinta e dois dentes, tanto quis se limpar de seu cheiro de sexo venéreo que, ao banhar-se em sua água divina, resolveu a terra fisgá-lo num rápido ato de real compreensão e envolvimento e arrancar-lhe mais alguns dentes.

Era a primeira vez que perdia a idade.

Costumava atrelar a vida a um processo evolutivo e, por esse motivo, este dia de sua queda tornou-se sua efeméride particular: a cada ano que passaria, ele voltaria a recordar saudosamente daquele dente que se passou e da desevolução que viria. Sem 32, quão impotente seria! Perdeu o dom de cortar e triturar bicho; perdeu o som, o discurso e o pio. E, a partir de agora, não perderia mais nada.

Trocou o vidro pelo plástico para não deixar de ter o que mais amava: chafurdado no fundo do seu copo, era agora translúcido aos olhos mundanos. “Era um plástico que os separava?”, pensou e logo se permitia acreditar que era esta a razão por que agora havia um discurso contra o plástico.

Só em filme norte-americano um plástico dançando tresloucado na rua faria sentido. Nem seu antigo pessimismo era agora real – só uma apatia grunhindo sem dente no meio de tanto desodorante vencido e gente de cheiro sintético. Sua cirrose não mais o fazia gemer; talvez, dentro de seu infindável copo, a vida nem tenha lhe sido finita.

Tanto faz, tanto fez. Nem ele mesmo liga desde a primeira vez que perdeu o sorriso e a idade.

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